Espingarda na mão de macaco
Semana passada ouvi esta expressão de um peão-amigo...
Semana passada ouvi esta expressão de um peão-amigo, o Geter. De fato, por mais que eu ame e elogie os primatas, dar uma espingarda na mão de um símio é preocupante e perigoso. Tem muitas pessoas neste mundo que, embora imbecis, limitadas, boçais, recebem um poder desmedido e acabam por fazer um estrago incalculável. Estão aí alguns políticos que não me deixam mentir. Outra coisa: as pessoas têm a impressão, por exemplo, que pelo fato do cara ter um curso superior, ele domina aquele assunto profundamente. Uma ova!
Os médicos humanos, para dar um bom exemplo, grande parte, e eu disse, grande parte, despreparada, desatualizada, ignorante e a gente dá a vida nas mãos destes caras! Vai estudar, doutor! Para receitar Cataflan e Eritromicina faço eu mesmo, pesquiso no Google! Não preciso enfrentar fila e receber um diagnóstico ‘meia boca’ que pode estar pondo minha pobre vida em risco. Cuidado, gente!
Isso vale para a medicina veterinária também. O cara se forma numa faculdade meia boca e, de repente, é veterinário de equinos ou “equinosh”. Posa de doutor, faz lá seu marketing e a turma acredita. Num sabe piciroca nenhuma, mas é doutor em “equinosh”. O perigo é o poder que é dado a ele. Ele tem o direito sobre a vida ou a morte. História de brincar de Deus.
Fiquei passado! (bem bicha esta expressão, né?) No início do mês fui atender uma emergência num haras no município de Laranjal Paulista, de um parto distocico de égua. Um concorrente já tinha ido antes e fuçado. O serviço que o ‘lazarento do doutor’ fez ? Eu te conto... Como o potro não saía, pegou a “porra” de um fetótomo (fio de serra) e tentou seccionar o potro quarto de milha. Quando não conseguiu, picotou o bicho todo, dilacerou o útero e a vagina e rompeu o reto. Quer mais? Mandou sacrificar mãe e filho, pois o caso não tinha solução. Espingarda na mão de macaco! P. da vida, após analisar a gravidade da situação, a única saída era por um ponto final a tudo aquilo. Que merda. O estrago do útero e do reto era irrecuperável. A égua teria que ser sacrificada. Mas pasmem: apesar de tudo, o potro estava vivo! A barriga mexia e ele se debatia querendo vida! Vida! Algo precisava ser feito. Não havia muito mais tempo, então anestesiei a égua ali no pasto mesmo e meti o bisturi no flanco, sem depilar, sem nada e o tirei vivo. Depois o batizei de Scarface. O macaco estava parcialmente desarmado. (Crônica publicada na edição 81 da Revista Horse)

Emílio Fontana Filho
é médico veterinário, formado pela UNESP Botucatu, em 1982, dramaturgo e colunista da Revista Horse. Consulte o autor sobre palestras e coaching sonre assuntos veterinários e afins. E-mail: [email protected]
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